O evento político protagonizado por Lula em São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, foi deplorável. Em latitudes menos incivilizadas do que as brasileiras, governo nenhum organiza evento para anunciar auxílio a uma região devastada por intempéries.
Nessas latitudes, os anúncios de ajuda são sóbrios, as visitas às cidades atingidas não são espetaculosas, não há autoridades e familiares de autoridades produzindo fotos e vídeos para o Instagram. A desgraça alheia implica solidariedade, não oportunidade. Se Jair Bolsonaro pecou pela ausência, Lula peca pela exploração. O primeiro pecado leva para o Inferno, o segundo leva para o Purgatório.
No evento que foi organizado em uma cidade comandada pelo PT, viu-se um governador constrangido com o espetáculo montado pelo governo federal. Viram-se autoridades locais no papel de coadjuvantes. Viu-se uma claque batendo palmas e gritando como se estivesse em ato de campanha eleitoral — e estava, só que antecipado.
O ato de campanha eleitoral antecipada não foi só para o próprio Lula, mas também para o ministro extraordinário que ele nomeou para ajudar na reconstrução do Rio Grande do Sul: o seu ainda ministro da Secom, Paulo Pimenta. Gaúcho, ele quer ser eleito governador do estado em 2026.
O governador Eduardo Leite soube pela imprensa da nomeação do rival político. Ou seja, configurou-se uma intervenção branca em um estado cuja história é marcada por tentativas de independência e que preza a sua autonomia como talvez nenhum outro da federação.
Até integrantes do PT torceram no nariz para a nomeação por acreditarem que a politização da catástrofe desserve ao partido. Lula, porém, não ouve ninguém que não seja a sua atual mulher. Paulo Pimenta, aliás, é dos poucos que frequentam o Palácio do Alvorada nos fins de semana.
Chamou a atenção a presença do presidente do STF, Luis Roberto Barroso, bem como a de outros integrantes do Judiciário do estado. A explicação é que se queria mostrar a união dos poderes na solidariedade ao Rio Grande do Sul. No entanto, a solidariedade mais efetiva e adequada às vítimas gaúchas — e a todos os cidadãos brasileiros — seria brecar a indecente PEC do Quinquênio, que aumentará automaticamente salários de juízes a cada cinco anos, com impacto bilionário nas já capengas contas públicas.
A fala de Luis Roberto Barroso contrastou com o que se desenrolava ao seu redor. O presidente do STF disse que se atingia ali “patamar civilizatório da não politização de uma crise humanitária”. Esse patamar civilizatório, no entanto, permaneceu debaixo d’água.
Como se não bastasse, na sua incontinência verbal, Lula soltou uma frase que reforçou o estereótipo de um estado composto apenas por brancos ricos ou remediados. Ele disse: “Eu falei para a Janja no domingo que é impressionante. Eu não tinha noção que aqui tinha tanta gente negra. E ela me falou que são os mais pobres e moram nos lugares mais arriscados para serem vítimas dessas coisas”.
O que se viu em São Leopoldo foi um esforço propagandístico para fazer frente às críticas nas redes sociais à atuação do governo federal na tragédia. Em resumo, para conter danos eleitorais mais adiante e lançar o candidato do PT ao governo do estado. Não bastou classificar todas as críticas e denúncias de “fake news”, foi preciso fazer mais. Isso nada tem a ver com solidariedade. Deplorável
Mário Sabino – Metrópoles
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